sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

“Não faz mais sentido abrir agências bancárias tradicionais”

 O Banco do Brasil anunciou recentemente o fechamento de 402 agências e um plano de aposentadoria incentivada. O objetivo? Melhorar a eficiência operacional e tornar o banco digital, conta o vice-presidente Raul Moreira
Raul Moreira, vice-presidente de Negócios de Varejo do BB (Foto: Divulgação)
O Banco do Brasil quer mudar de cara. A maior instituição financeira do país, com uma história de 200 anos, irá passar por uma ampla reformulação para se adaptar aos novos rumos  do sistema bancário brasileiro e se tornar um banco também digital. As mudanças não serão sutis...

 O BB, líder nacional em número de agências, irá fechar 402 delas e transformar outras 379 em postos de atendimento bancário até o primeiro trimestre de 2017. Ao mesmo tempo, a instituição irá abrir ao longo do próximo ano 255 unidades de atendimento digital, entre escritórios e agências.

Visando a redução do quadro de funcionários, o BB também lançou um plano de incentivo à aposentadoria para um público potencial de 18 mil colaboradores, o equivalente a 16% do total. Nesta segunda-feira, o banco anunciou que 9,4 mil funcionários aderiram ao plano.

A ascensão das startups financeiras, as chamadas fintechs, e o maior uso dos canais digitais no relacionamento com os bancos não são as únicas preocupações do BB.

A rentabilidade do banco também tem sofrido. No terceiro trimestre deste ano, o retorno sobre o patrimônio líquido foi de 9,9%, significativamente menor do que o de seus concorrentes privados, hoje em torno de 20%. “A transformação digital, a busca de eficiência e o foco no atendimento ao cliente são os eixos da nossa estratégia para os próximos dois anos”, afirma o vice-presidente de Negócios de Varejo do BB, Raul Moreira.

O que levou ao diagnóstico de que o Banco do Brasil precisava mudar?
 
Vínhamos detectando movimentos importantes no comportamento do consumidor, principalmente o fato de ele privilegiar e ficar mais satisfeito com os canais digitais. Nos últimos dois anos, houve um crescimento exponencial da utilização desse tipo de atendimento. 

Uma pesquisa mostrou que mais da metade dos nossos clientes Estilo [com renda mensal acima de R$ 8 mil] já não comparecia a uma agência há mais de seis meses. Eles continuavam a consumir produtos e serviços e a se relacionar com o banco, mas usavam a internet e o mobile, além do ATM como um ponto de apoio. 

Chegamos à conclusão de que precisávamos remodelar a forma de atendimento e concatenar a presença física com essa forte tendência de migração do cliente para o canal digital.

Como foram escolhidas as agências que vão fechar?
 
Fizemos um estudo e verificamos as agências que estavam se esvaziando. Vamos fechar as mais ineficientes, 402. Existem outras 379 que iremos transformar em postos de atendimento. Neste caso, não muda nada no atendimento bancário. Verificamos apenas que a complexidade daquele ponto não exigia mais um gerente geral.

Onde se concentram as agências que irão fechar?
 
A divisão é proporcional ao tamanho do estado. Em Santa Catarina e São Paulo, onde adquirimos bancos regionais, precisávamos buscar um nível de eficiência maior, pois havia casos de sobreposição. Portanto, há uma pequena concentração em São Paulo, por causa da Nossa Caixa, em Santa Catarina, por causa do Besc, e também no Rio de Janeiro. 

O fechamento dessas 402 agências, no entanto, não terá impacto no atendimento do cliente, porque elas já estavam sendo pouco utilizadas. O banco não está encolhendo na proporção que a sociedade imagina. Estamos remodelando a forma de atendimento, porque a tendência de transformação digital é inegável. A soma das transações via internet e mobile já ultrapassou 67% do total.

O BB anunciou a criação de mais de 200 escritórios digitais. Como eles funcionam?
 
Vamos criar 255 escritórios digitais [hoje o BB tem 245]. Ao invés de termos um ponto na rua, subutilizado e mais caro, usamos um espaço em um prédio — normalmente já ocupado por algum órgão do banco. Colocamos um gerente geral, um gerente de contas e supervisores. Treinamos essas pessoas. Criamos um ambiente tecnológico e ampliamos o horário de atendimento. Uma agência tradicional funciona das 10h às 16h. 

Um escritório de negócios, das 8h às 22h. Neles, implantamos uma tecnologia chamada Fale com seu Gerente, que funciona igualzinho ao WhatsApp, mas é um log bancário. 

Ele tem assinatura reconhecida e eletrônica. Dessa forma, praticamente tudo pode ser resolvido com o celular. A experiência do consumidor melhora muito, assim como seu nível de satisfação. Os clientes aumentam de 20% a 40% o consumo de produtos e serviços. Atualmente, 1,3 milhão já migraram para o modelo digital de atendimento de escritório de negócios.

A rentabilidade do BB está atualmente abaixo da média do mercado. A reestruturação irá recuperá-la?
 
É uma das coisas que vai preparar o banco para ser mais eficiente e rentável. A atual rentabilidade do banco é afetada por muitos fatores: envolve grandes operações de crédito que todos os bancos fizeram, cenário econômico desafiador e inadimplência em alguns segmentos. Mas é uma questão passageira.

O que precisamos é nos preparar para a volta de um cenário de crescimento. Não faz mais sentido abrir agências tradicionais. Esse é um modelo que mudou e não volta mais. A gente precisa ser ágil nesse processo de transformação.

O plano de reorganização começou a ser feito antes ou depois de Temer assumir a Presidência?
 
Já era uma coisa que vinha sendo estruturada e pensada. Não foi de supetão. Fizemos várias pesquisas. Mas com a gestão do presidente Caffarelli [Paulo Rogério Caffarelli assumiu a presidência do BB em maio, após Dilma Rousseff ser afastada] antecipamos uma série de movimentos e aceleramos bastante o projeto estratégico de transformação digital do banco. Esse mês vamos bater um bilhão de transações por celular. Nunca imaginamos que chegaríamos tão rápido a esse ponto. A gente precisava responder a essa demanda.

Muitos analistas interpretaram as mudanças como uma maneira de aproximar a estratégia do BB a de outros bancos privados e como uma mensagem de que o banco será menos usado como instrumento de política econômica. Eles estão corretos?
 
Não. Esse processo de transformação do banco não tem nenhum sentido de direcionamento político. Foi montado com bases técnicas, para ganhar eficiência e preparar o BB para um novo cenário. Agora, nós queremos nos aproximar dos nossos concorrentes em rentabilidade? Sem a menor dúvida. E faremos isso. Em termos de transformação digital, estamos à frente de vários deles.

É possível que após a reestruturação o BB acabe ficando com um número de agências inferior ao do Bradesco. Isso é encarado como um problema?
 
Não. O número de agências físicas tradicionais não é mais um referencial para os grandes bancos de varejo. Isso mudou. Não é o mais adequado para mensurar a eficiência de uma instituição financeira, nem sua presença. O essencial é a quantidade de clientes se relacionando com o banco. O critério de contar agência na rua ficou completamente ultrapassado.

O BB anunciou um plano de aposentadoria para até 18 mil funcionários, praticamente 16% da força de trabalho. Esse pessoal estava ocioso? Não vai fazer falta?
 
O plano de aposentadoria que apresentamos é incentivado. Opcional. O BB não está com um programa de demissão. O banco não vai demitir pessoas.

Mesmo se a meta de desligamentos não for atingida?
 
Não existe nenhum projeto nesse sentido. Nós mostramos o novo rumo do banco. O novo BB é um banco digital. E existem pessoas que estão habilitadas a se aposentar e podem não querer fazer parte deste banco digital. É uma coisa extremamente democrática.

A folha de pagamento do BB é R$ 3 bilhões mais custosa ao ano do que a de seus concorrentes. Não é um peso?
 
Parte do plano da reorganização é ser mais eficiente. Mas se estivéssemos só com essa obsessão sobre a folha de pagamento, lançaríamos um programa de demissão. O objetivo é readequar o banco ao cenário.

Alguns analistas demonstraram a preocupação de que a redução do número de agências possa reduzir a venda de produtos da BB Seguridade. Vocês esperam isso?
 
Vai haver um impacto positivo. Não tem nada a ver o que alguns analistas falaram. Foi uma infelicidade absurda. Não estamos perdendo clientes. O consumo de produtos de seguridade aumenta quase 30% nos escritórios digitais de negócios. Na verdade, a gente cria um ambiente muito bom para a BB Seguridade trabalhar em parceria com o BB.

Outra questão é o impacto desse plano de aposentadoria sobre a Previ. Isso preocupa vocês?
 
Não. Mas é a Previ que pode se manifestar a respeito desse assunto. Foi uma outra análise equivocada do mercado, na minha opinião.

Fonte:Negócios

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