Edifícios adotam soluções para seus idosos
Enquanto as incorporadoras
ainda esperam melhores condições econômicas para lançar empreendimentos
voltados às pessoas idosas, com infraestrutura acessível e serviços de
geriatria e fisioterapia, por exemplo, condomínios se adaptam para promover
melhor qualidade de vida para os idosos que já moram lá...
É o caso do Mofarrej, condomínio na Vila Mariana administrado pela
Hubert, que instalou um novo playground – não para as crianças, e sim
para os cerca de 30% dos seus moradores que já têm mais de 60 anos. O
síndico do prédio, Carlos Humberto Correia, conta que a ideia partiu do
morador Henrique Wuilleumier, de 85 anos. “Quando a idade chega,
percebemos que é preciso se exercitar mais. Eu vi que havia um gramado
disponível na área comum do condomínio e sugeri que fosse instalado uma
academia ao ar livre para a terceira idade”, conta Wuilleumier.
O parquinho foi um projeto da empresa Playlong, que surgiu inspirada
em aparelhos de ginástica chineses. O proprietário, Artur Henrique
Carvalho, que morava em Araras, interior de São Paulo, levou o projeto
para a Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro.
Lá, em conjunto com idosos e alunos de educação física do Instituto
de Biociências, estudaram a importância da atividade física para as
pessoas mais velhas e desenharam uma série de aparelhos de ginástica.
“Pensamos na flexibilidade, força e capacidade de quem envelhece; e
também na leveza, altura e ergometria da academia”, diz Carvalho.
Para instalar os 14 equipamentos da empresa, um condomínio gasta
cerca de R$ 26 mil. O pacote com sete aparelhos custa R$ 16 mil. É
preciso uma área de lazer, de preferência a céu aberto e em área de
sombra. A academia é chumbada ao chão.
“Defendo que os prédios integrem os moradores idosos. Muitas vezes,
eles não querem saber da molecada que faz barulho e não têm um espaço
próprio para interagir e se integrar que não seja o elevador. O
playground da longevidade é uma possibilidade de distração.” Carvalho
diz que já viu casal de idosos se formar em um dos condomínios onde
instalaram o projeto.
Além do parquinho, o condomínio Mofarrej também adotou itens de
acessibilidade, como rampas, cadeiras de roda e suporte para atender
moradores que precisam de atendimento médico domiciliar.
Acessíveis. Instrumentos como esses estão no projeto
do empreendimento Jardim das Perdizes, da incorporadora Tecnisa. O
programa, chamado de Consciência Gerontológica, é responsável pela
infraestrutura integrativa que fornece pisos podotáteis, piscina
adaptada para usuários de cadeiras de roda e com escadas fixas de
alvenaria, mais seguras para os idosos do que os degraus de alumínio que
ficam na borda.
Segundo a gerente de projetos da Tecnisa, Gisele de Luca, a empresa
percebeu que 15% dos seus clientes tinham mais do que 55 anos de idade. A
incorporadora contratou então uma equipe de gerontologia, geriatria e
arquitetos especialistas que analisaram aspectos de inclusão técnicos e
sociais, responsáveis por possibilitar a socialização e integração entre
diferentes gerações.
Carlos Humberto Correia, síndico. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO – TIRADA COM UM CELULAR MOTO Z + CÂMERA HASSELBLAD TRUE ZOOM |
“Além disso tomamos outros cuidados técnicos, como não utilizar
porcelanatos brilhantes nas áreas comuns, que atrapalham a vista, criar
barreiras visuais em portas de vidro para impedir colisões e colocar
cadeiras com braços nos salões de festas para ajudar os idosos a se
levantarem”, diz Gisele.
Outra incorporadora que está de olho nesse mercado é a Vitacon.
Segundo o CEO da incorporadora, Alexandre Lafer Frankel, está para ser
lançado o VN Apiacás, ao lado da unidade do Hospital Albert Einstein, em
Perdizes. “Vamos proporcionar para quem está entrando na velhice uma
estrutura de cuidados básicos, com sala de fisioterapia e acompanhamento
de cuidadores”, diz. “A ideia é vender para todas as idades, mas com
foco nesse público que precisa desse tipo de solução, já existente em
outros países.”
Para a arquiteta e professora de gerontologia da USP Maria Luisa
Trindade Bestetti, essa estrutura condominial pode favorecer os idosos
que não se sentem mais seguros para andar nas cidades.
“Apesar de muitas vezes incentivarem isolamento e segregação, esses
empreendimentos permitem que as pessoas mais velhas interajam com
outras. É uma extensão do apartamento – que está cada vez menor. Nas
áreas externas, dá para encontrar crianças, vizinhos e viver novas
experiências que não seriam possíveis na rua”, diz.
A professora especialista em gerontologia da Universidade Federal de
São Carlos (UFSCAR) Cristina Antoniossi acredita que o trabalho ao qual o
mercado se propõe a fazer é produtivo. “Cada vez mais o público vai
valorizar essa adaptação dos espaços, principalmente depois da aprovação
do Estatuto da Pessoa com Deficiência em 2015. Ele exige que as
edificações públicas e privadas de uso coletivo já existentes garantam
acessibilidade à pessoa com deficiência em suas dependências e
serviços.”
Casa boa
Segundo a arquiteta e gerontológa da USP Maria Luisa Trindade
Bestetti, estes são alguns itens que podem deixar o lar mais agradável e
acessível aos idosos:
Apoios seguros
Cadeiras e poltronas devem ter braços que auxiliem o idoso a se levantar sem forçar o joelho ou se desequilibrar.
Móveis que se movem
Estantes e mesas com rodinhas são práticas e evitam que as pessoas mais velhas carreguem peso durante a limpeza ou manutenção. Mas precisam ser rodas com travas, para que o idoso não se apoie e caia.
Altura prevenida
Eletrodomésticos nem muito altos nem baixos, para que a pessoa não tenha de fazer esforço para se levantar ou abaixar e machucar a coluna. O mesmo vale para armários da cozinha com utensílios que são muito usados. O ideal é que tudo esteja na altura da bancada.
Barra de apoio
Elas são úteis para todas as idades, principalmente em locais com umidade, como banheiros. Corrimãos também são essenciais nas escadas.
Sensor de presença
Até mesmo dentro de casa ele é útil. É possível instalar em corredores longos ou que levam a banheiros. Como a velhice traz lentidão de sentidos, caso o idoso acorde de madrugada, a luz auxiliar ajuda na localização.
Porta com espaço
As portas não precisam ter mais do que 80 cm, mas devem permitir a rotação de uma cadeira de rodas, por exemplo, para que o usuário tenha passagem livre.
Identidade
A casa deve refletir a personalidade do morador. Se um tapete tem valor afetivo, mas pode provocar queda, use-o na parede como um quadro. Cores trazem alegria e vivacidade.
Cidades têm empreendimentos voltados para esse público
Um empreendimento imobiliário voltado para pessoas a partir de 50
anos de idade (embora só seja considerado idoso quem tem mais de 60
anos) foi erguido no interior de São Paulo. Trata-se do condomínio da
Associação Geronto Geriátrica de São José do Rio Preto (Agerip), que é o
lar de 600 pessoas. O conjunto tem três tipos de moradia: apartamentos,
suítes e chalés.
Nos dois primeiros modelos, o morador tem acesso a todas as refeições, limpeza, atividades físicas, cognitivas e ocupacionais, enfermaria, terapia, geriatria e assistência social. Todas as unidades são térreas.
Para morar, é preciso pagar cerca de R$ 15 mil pelo título de
associação à Agerip e mais a mensalidade e o aluguel, que juntos, variam
de R$ 3.500 a R$ 7.700, para uma ou duas pessoas. As unidades variam
entre 25 m² para suítes e 60 m² para os apartamentos.
Os chalés são construídos ao gosto dos idosos, que pagam pela
associação e pelo terreno. As casas devem ter entre 60 m² e 160 m² e
seguir as normas de acessibilidade da ABNT. Podem morar casais, irmãos,
amigos ou mesmo apenas uma pessoa. Quem mora nessa área tem acesso à
área comum, onde são realizadas as atividades físicas e de lazer.
Serviços médicos e de cuidadores devem ser pagos a parte, assim como os
R$ 260 de condomínio e os R$ 298 da manutenção do título.
Segundo a moradora e atual presidente da Agerip, Candida Pereira
Azem, de 63 anos, todas as residências são preparadas para o envelhecer.
“A grande dificuldade do idoso é a solidão. Na velhice, você fica
vulnerável, mais suscetível a assalto, às calçadas perigosas e outras
dificuldades. Aqui, as casas não têm muros, os vizinhos são amigos,
ouvem a mesma música, vivem tudo isso junto.”
A autonomia e a independência são incentivadas. É possível ir e vir
para onde e quando quiser e também receber visitas e hóspedes. “Quem
mora no chalé pode cozinhar em casa ou ter as refeições no restaurante.
Nosso espaço tem desde piscina com hidro até cabeleireiro com designer
de sobrancelhas”, conta Candida. “É um condomínio normal, como outro
qualquer, só que mais apropriado para essa fase da vida.”
Segundo Candida, a diferença da Agerip para outros empreendimentos é a
finalidade. A associação não tem fins lucrativos, mas também não é uma
instituição de caridade e não tem ajuda do governo. “Somos procurados
para dar consultoria e expandir o nosso modelo como um negócio, mas não é
essa a nossa intenção.”
Públicas. É possível encontrar em algumas cidades
programas de governo que oferecem residência para idosos e que não são
instituições de longa permanência (ILPI) – ou asilos. Na Paraíba, quatro
cidades recebem o Cidade Madura, programa de habitação voltado para
maiores de 60 anos de baixa renda. São 40 unidades habitacionais em
condomínios com ginástica, mesa de jogos, pista de caminhadas, centro de
convivência e ponto de apoio com enfermeira e psicóloga. Em São Paulo, a
Vila dos Idosos, no Pari, é um programa de locação social com 145
unidades mantido pela prefeitura desde 2007.
Fonte: Estadão
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