Foto de divulgação
Além do narcisismo e do culto ao corpo, os clubes fitness
se fecham como comunidades religiosas - e também vão tentar te converter... A
onda fitness está por todo lado – seja no Instagram ou nas 23.398 academias
espalhadas pelo Brasil, quantidade equivalente a 50% de toda América Latina...
Mesmo entre os esportistas, o CrossFit e os clubes de exercícios especializados
se destacam. Aderir se torna uma filosofia de vida, só que como a inversão da
regra do Clube da Luta: um crossfitter sempre fala sobre o seu grupo de
CrossFit.
Não é para menos. Segundo um relatório da Associação
Internacional de Saúde e Clubes Esportivos, esse movimento continua crescendo
porque consegue motivar as pessoas muito mais que outros exercícios. Para
começar, o CrossFit e outros clubes, como os de spinning “tipo boutique”, em
geral custam mais caro que as mensalidades de pequenas academias. Só por isso,
o estilo de vida já se torna mais exclusivo. Mas a verdadeira motivação geradas
por esses clubes é mais visceral.
Eles se apoiam na nossa necessidade inerente de
pertencimento. Queremos fazer parte de um conjunto de iguais que trabalha por
algo maior. Para ter essa sensação é que muita gente está disposta a pagar caro
para virar pneu de caminhão e puxar peso todo dia (além, é óbvio, dos
resultados que os exercícios têm no corpo). Ao contrário de uma academia comum,
em que os vários tipos de aulas e equipamento atraem vários tipos de faixa
etária e objetivos, no CrossFit todo mundo tem um perfil parecido.
Esse tipo de clube também trabalha com a nossa
autoestima. No CrossFit, todos os alunos são chamados de atletas. O instrutor é
o treinador. E o ambiente extremamente coletivo faz com que qualquer membro
mais ou menos regular seja percebido quando falta. É impossível se esconder
atrás de um livro ou na bicicleta ao fundo da sala, como em uma academia comum.
Não é só o relatório da Associação que percebeu que as
motivações dos crossfitters têm muito a ver com a necessidade de pertencimento
e de apreciação individual. A socióloga Marcelle Dawson, da Universidade de
Otago, na Nova Zelândia, estudou o CrossFit para responder uma pergunta: será
que dá para considerá-lo um culto?
E ela descobriu, sim algumas semelhanças entre os clubes
de CrossFit e as comunidades religiosas. Existe uma certa devoção ao treinador,
a percepção de que os membros têm um status superior (afinal, o slogan da
modalidade é “forjar fitness de elite”), uma determinação quase infinita de
atingir os objetivos propostos pela comunidade e o desejo de recrutar mais
membros. Há também os termos técnicos, que acabam compondo uma linguagem própria
e a recomendação de uma dieta especial.
Além disso, pouco a pouco, a pessoa que se envolve
intensamente vai tendo cada vez mais dificuldade de se identificar com gente
fora daquela comunidade. É como um amigo de bar que se converte a uma religião
que proíbe o álcool: a relação se torna difícil de manter.
Mesmo assim, a conclusão da socióloga é que o CrossFit se
encaixa mais no conceito Instituição Reinventiva, da socióloga Susie Scott.
Seria uma estrutura simbólica ou material através da qual os membros procuram
voluntariamente uma nova identidade ou status social. Ou seja, ainda que parte
do que prende as pessoas no CrossFit seja a coletividade do clube, a motivação
enraizada é profundamente individual.
Essa tal reinvenção da identidade pode ser interpretada
de jeitos diferentes dentro da sociologia. Tem quem diga que ela é positiva: um
processo de transformação e autoaperfeiçoamento. Mas a própria criadora do
termo afirma que essas instituições acabam criando novas identidades genéricas,
que querem se adequar ao “normal” do grupo com tanta intensidade que acabam
apagando a individualidade.
Se você tem um amigo que está entrando de cabeça na vida
da marombagem, fica um alerta: as suas visitas à praça de alimentação do
shopping nunca mais serão as mesmas.
Fonte:Ana Carolina Leonardi - Superinteressante
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